O movimento
chamado "igreja ao gosto do freguês" está invadindo muitas
denominações evangélicas, propondo evangelizar através
da aplicação das últimas técnicas de marketing.
Tipicamente, ele começa pesquisando os não-crentes (que um dos
seus líderes chama de "desigrejados" ou "João e
Maria desigrejados"). A pesquisa questiona os que não freqüentam
quaisquer igrejas sobre o tipo de atração que os motivaria a assistir
às reuniões. Os resultados do questionário mostram as mudanças
que poderiam ser feitas nos cultos e em outros programas para atrair os "desigrejados",
mantê-los na igreja e ganhá-los para Cristo. Os que desenvolvem
esse método garantem o crescimento das igrejas que seguirem cuidadosamente
suas diretrizes aprovadas. Praticamente falando, dá certo!
Duas igrejas são
consideradas modelos desse movimento: Willow Creek Community Church (perto de
Chicago), pastoreada por Bill Hybels, e Saddleback Valley Church (ao sul de
Los Angeles) pastoreada por Rick Warren. Sua influência é inacreditável.
Willow Creek formou sua própria associação de igrejas,
com 9.500 igrejas-membros. Em 2003, 100.000 líderes de igrejas assistiram
no mínimo a uma conferência para líderes realizada por Willow
Creek. Acima de 250.000 pastores e líderes de mais de 125 países
participaram do seminário de Rick Warren ("Uma Igreja com Propósitos").
Mais de 60 mil pastores recebem seu boletim semanal.
Visitamos Willow Creek há
algum tempo. Pareceu-nos que essa igreja não poupa despesas em sua missão
de atrair as massas. Depois de passar por cisnes deslizando sobre um lago cristalino,
vê-se o que poderia ser confundido com a sede de uma corporação
ou um shopping center de alto padrão. Ao lado do templo existe
uma grande livraria e uma enorme área de alimentação completa,
que oferece cinco cardápios diferentes. Uma tela panorâmica permite
aos que não conseguiram lugar no santuário ou que estão
na praça de alimentação assistirem aos cultos. O templo
é espaçoso e moderno, equipado com três grandes telões
e os mais modernos sistemas de som e iluminação para a apresentação
de peças de teatro e musicais.
Sem dúvida, Willow
Creek é imponente, mas não é a única megaigreja
que tem como alvo alcançar os perdidos através dos mais variados
métodos. Megaigrejas através dos EUA adicionam salas de boliche,
quadras de basquete, salões de ginástica e sauna, espaços
para guardar equipamentos, auditórios para concertos e produções
teatrais, franquias do McDonalds, tudo para o progresso do Evangelho. Pelo menos
é o que dizem. Ainda que algumas igrejas estejam lotadas, sua freqüência
não é o único elemento que avaliamos ao analisar essa última
moda de "fazer igreja".
O alvo declarado dessas
igrejas é alcançar os perdidos, o que é bíblico
e digno de louvor. Mas o mesmo não pode ser dito quanto aos métodos usados para alcançar esse alvo. Vamos começar pelo marketing como
uma tática para alcançar os perdidos. Fundamentalmente, marketing
traça o perfil dos consumidores, descobre suas necessidades e projeta
o produto (ou imagem a ser vendida) de tal forma que venha ao encontro dos desejos
do consumidor. O resultado esperado é que o consumidor compre o produto.
George Barna, a quem a revista Christianity Today (Cristianismo Hoje)
chama de "o guru do crescimento da igreja", diz que tais métodos
são essenciais para a igreja de nossa sociedade consumista. Líderes
evangélicos do movimento de crescimento da igreja reforçam a idéia
de que o método de marketing pode ser aplicado – e eles o têm aplicado
– sem comprometer o Evangelho. Será?
Em primeiro lugar o Evangelho,
e mais significativamente a pessoa de Jesus Cristo, não cabem em nenhuma
estratégia de mercado. Não são produtos a serem vendidos.
Não podem ser modificados ou adaptados para satisfazer as necessidades
de nossa sociedade consumista. Qualquer tentativa nessa direção
compromete de algum modo a verdade sobre quem é Cristo e do que Ele fez
por nós. Por exemplo, se os perdidos são considerados consumidores,
e um mandamento básico de marketing diz que o freguês sempre tem
razão, então qualquer coisa que ofenda os perdidos deve ser deixada
de lado, modificada ou apresentada como sem importância. A Escritura nos
diz claramente que a mensagem da cruz é "loucura para os que
se perdem" e que Cristo é uma "pedra de tropeço
e rocha de ofensa" (1 Co 1.18 e 1 Pe 2.8).
Megaigrejas adicionam salas de boliche, quadras de basquete,
salões de ginástica e sauna, auditórios para concertos
e produções teatrais, franquias do McDonalds.
Algumas igrejas voltadas ao consumidor procuram evitar esse aspecto negativo do Evangelho de Cristo enfatizando os benefícios temporais de ser cristão e colocando a pessoa do consumidor como seu principal ponto de interesse. Mesmo que essa abordagem apele para a nossa geração acostumada à gratificação imediata, ela não é o Evangelho verdadeiro nem o alvo de vida do crente em Cristo.
Em segundo lugar, se você
quiser atrair os perdidos oferecendo o que possa interessá-los, na maior
parte do tempo estará apelando para seu lado carnal. Querendo ou não,
esse parece ser o modus operandi dessas igrejas. Elas copiam o que é
popular em nossa cultura – músicas das paradas de sucesso, produções
teatrais, apresentações estimulantes de multimídia e mensagens
positivas que não ultrapassam os trinta minutos. Essas mensagens freqüentemente
são tópicas, terapêuticas, com ênfase na realização
pessoal, salientando o que o Senhor pode oferecer, o que a pessoa necessita
– e ajudando-a na solução de seus problemas.
Essas questões podem
não importar a um número cada vez maior de pastores evangélicos,
mas, ironicamente, estão se tornando evidentes para alguns observadores
seculares. Em seu livro The Little Church Went to Market (A Igrejinha
foi ao Mercado), o pastor Gary Gilley observa que o periódico de marketing American Demographics reconhece que as pessoas estão:
...procurando espiritualidade,
não a religião. Por trás dessa mudança está
a procura por uma fé experimental, uma religião do coração,
não da cabeça. É uma expressão de religiosidade
que não dá valor à doutrina, ao dogma, e faz experiências
diretamente com a divindade, seja esta chamada "Espírito Santo"
ou "Consciência Cósmica" ou o "Verdadeiro Eu".
É pragmática e individual, mais centrada em redução
de stress do que em salvação, mais terapêutica do que teológica.
Fala sobre sentir-se bem, não sobre ser bom. É centrada no corpo
e na alma e não no espírito. Alguns gurus do marketing começaram
a chamar esse movimento de "indústria da experiência"
(pp. 20-21).
Existe outro item que muitos
pastores parecem estar deixando de considerar em seu entusiasmo de promover
o crescimento da igreja atraindo os não-salvos. Mesmo que os números
pareçam falar mais alto nessas "igrejas ao gosto do freguês"
(um número surpreendente de igrejas nos EUA (841) alcançaram a
categoria de megaigreja, com 2.000 a 25.000 pessoas presentes nos finais de
semana), poucos perceberam que o aumento no número de membros não
se deve a um grande número de "desigrejados" juntando-se à
igreja.
Durante os últimos
70 anos, a percentagem da população dos EUA que vai à igreja
tem sido relativamente constante (mais ou menos 43%). Houve um crescimento,
chegando a 49% em 1991 (no tempo do surgimento dessa nova modalidade de igreja),
mas tal crescimento diminuiu gradualmente, retornando a 42% em 2002 (www.barna.org).
De onde, então, essas megaigrejas, que têm se esforçado
para acomodar pessoas que nunca se interessaram pelo Evangelho, conseguem seus
membros? Na maior parte, de igrejas menores que não estão interessadas
ou não têm condições financeiras de propiciar tais
atrações mundanas. O que dizer das multidões de "desigrejados"
que supostamente se chegaram a essas igrejas? Essas pessoas constituem uma parcela
muito pequena das congregações. G.A. Pritchard estudou Willow
Creek por um ano e escreveu um livro intitulado Willow Creek Seeker Services (Baker Book House, 1996). Nesse livro ele estima que os "desigrejados",
que seriam o público-alvo, constituem somente 10 ou 15% dos 16.000 membros
que freqüentam os cultos de Willow Creek.
O Evangelho e a pessoa de Jesus Cristo não
cabem em nenhuma estratégia de mercado.
Não são produtos a serem vendidos.
Se essa percentagem é
típica entre igrejas "ao gosto do freguês", o que provavelmente
é o caso, então a situação é bastante perturbadora.
Milhares de igrejas nos EUA e em outros países se reestruturaram completamente,
transformando-se em centros de atração para "desigrejados".
Isso, aliás, não é bíblico. A igreja é para
a maturidade e crescimento dos santos, que saem pelo mundo para alcançar
os perdidos. Contudo, essas igrejas voltaram-se para o entretenimento e a conveniência
na tentativa de atrair "João e Maria", fazendo-os sentirem-se
confortáveis no ambiente da igreja. Para que eles continuem freqüentando
a "igreja ao gosto do freguês", evita-se o ensino profundo das
Escrituras em favor de mensagens positivas, destinadas a fazer as pessoas sentirem-se
bem consigo mesmas. À medida que "João e Maria" continuarem
freqüentando a igreja, irão assimilar apenas uma vaga alusão
ao ensino bíblico que poderá trazer convicção de
pecado e verdadeiro arrependimento. O que é ainda pior, os novos membros
recebem uma visão psicologizada de si mesmos que deprecia essas
verdades. Contudo, por pior que seja a situação, o problema não
termina por aí.
A maior parte dos que freqüentam
as "igrejas ao gosto do freguês" professam ser cristãos.
No entanto, eles foram atraídos a essas igrejas pelas mesmas coisas que
atraíram os não-crentes, e continuam sendo alimentados pela mesma
dieta biblicamente anêmica, inicialmente elaborada para não-cristãos.
Na melhor das hipóteses, eles recebem leite aguado; na pior das hipóteses,
"alimento" contaminado com "falatórios inúteis
e profanos e as contradições do saber, como falsamente lhe chamam"
(2 Tm 6.20). Certamente uma igreja pode crescer numericamente seguindo esses
moldes, mas não espiritualmente.
Além do mais, não
há oportunidades para os crentes crescerem na fé e tornarem-se
maduros em tal ambiente. Tentando defender a "igreja ao gosto do freguês",
alguns têm argumentado que os cultos durante a semana são separados
para discipulado e para o estudo profundo das Escrituras. Se esse é o
caso, trata-se de uma rara exceção e não da regra!
Como já notamos,
a maioria dessas igrejas, no uso do seu tempo, energia e finanças tem
como alvo acomodar os "desigrejados". Conseqüentemente, semana
após semana, o total da congregação recebe uma mensagem
diluída e requentada. Então, na quarta-feira, quando a congregação
usualmente se reduz a um quarto ou a um terço do tamanho normal, será
que esse pequeno grupo recebe alimentação sólida da Palavra
de Deus, ensino expositivo e uma ênfase na sã doutrina? Dificilmente.
Nunca encontramos uma "igreja ao gosto do freguês" onde isso
acontecesse. As "refeições espirituais" oferecidas nos
cultos durante a semana geralmente são reuniões de grupos e aulas
visando o discernimento dos dons espirituais, ou o estudo de um "best-seller"
psico-cristão, ao invés do estudo da Bíblia.
Talvez o aspecto mais negativo
dessas igrejas seja sua tentativa de impressionar os "desigrejados"
ao mencionar especialistas considerados autoridades em resolver todos os problemas
mentais, emocionais e comportamentais das pessoas: psicólogos e psicanalistas.
Nada na história da Igreja tem diminuído tanto a verdade da suficiência
da Palavra de Deus no tocante a "todas as coisas que conduzem à
vida e à piedade" (2 Pe 1.3) como a introdução
da pseudociência da psicoterapia no meio cristão. Seus milhares
de conceitos e centenas de metodologias não-comprovados são contraditórios
e não científicos, totalmente não-bíblicos, como
já documentamos em nossos livros e artigos anteriores. Pritchard observa:
...em Willow Creek, Hybels
não somente ensina princípios psicológicos, mas freqüentemente
usa esses mesmos princípios como guias interpretativos para sua exegese
das Escrituras – o rei Davi teve uma crise de identidade, o apóstolo
Paulo encorajou Timóteo a fazer análise e Pedro teve problemas
em estabelecer seus limites. O ponto crítico é que princípios
psicológicos são constantemente adicionados ao ensino de Hybels"
(p. 156).
Nada na história da Igreja tem diminuído tanto a verdade da suficiência da
Palavra de Deus no tocante a "todas as coisas que conduzem à vida e
à piedade" (2 Pe 1.3) como a introdução da
pseudociência da psicoterapia no meio cristão.
Durante minha visita a Willow
Creek, o pastor Hybels trouxe uma mensagem que começou com as Escrituras
e se referia aos problemas que surgem quando as pessoas mentem. Contudo, ele
se apoiou no psiquiatra M. Scott Peck, o autor de The Road Less Travelled (Simon & Schuster, 1978) quanto às conseqüências desastrosas
da mentira. Nesse livro, M. Scott Peck declara (pp. 269-70): "Deus quer
que nos tornemos como Ele mesmo (ou Ela mesma)"!
A Saddleback Community Church
está igualmente envolvida com a psicoterapia. Apesar de se dizer cristocêntrica
e não centrada na psicologia, essa igreja tem um dos maiores números
de centros dos Alcoólicos Anônimos e patrocina mais de uma dúzia
de grupos de ajuda como "Filhos Adultos Co-Dependentes de Viciados em Drogas",
"Mulheres Co-Viciadas Casadas com Homens Compulsivos Sexuais ou com Desordens
de Alimentação" e daí por diante. Cada grupo é
normalmente liderado por alguém "em recuperação"
e os autores dos livros usados incluem psicólogos e psiquiatras (www.celebraterecovery.com).
Apesar de negar o uso de psicologia popular, muito dela permeia o trabalho de
Rick Warren, incluindo seu best-seller The Purpose Driven Life (A Vida
Com Propósito), que já rendeu sete milhões de dólares.
Em sua maior parte, o livro fala de satisfação pessoal, promove
a celebração da recuperação e está cheio
de psico-referências tais como "Sansão era dependente".
A mensagem principal vinda
das igrejas psicologicamente motivadas de Willow Creek e Saddleback é
a de que a Palavra de Deus e o poder do Espírito Santo são insuficientes
para livrar uma pessoa de um pecado habitual e para transformá-la em
alguém cuja vida seja cheia de fruto e agradável a Deus. Entretanto,
o que essas igrejas dizem e fazem tem sido exportado para centenas de milhares
de igrejas ao redor do mundo.
Grande parte da igreja evangélica
desenvolveu uma mentalidade de viagem de recreio em um cruzeiro cheio de atrações,
mas isso vai resultar num "Titanic espiritual". Os pastores de "igrejas
ao gosto do freguês" (e aqueles que estão desejando viajar
ao lado deles) precisam cair de joelhos e ler as palavras de Jesus aos membros
da igreja de Laodicéia (Ap 3.14-21). Eles eram "ricos e abastados" e, no entanto, deixaram de reconhecer que aos olhos de Deus eram "infelizes,
miseráveis, pobres, cegos e nus". Jesus, fora da porta dessas
igrejas, onde O colocaram desapercebidamente, oferece Seu conselho, a verdade
da Sua Palavra, o único meio que pode fazer com que suas vidas sejam
vividas conforme Sua vontade. Não pode existir nada melhor aqui na terra
e na Eternidade!
Publicado anteriormente na revista Chamada da Meia-Noite, março de 2005.
Nenhum comentário:
Postar um comentário