 
  1959                                  2016
             1959                                  2016
O livro foi um sucesso tremendo e foi adaptado várias vezes para o cinema. A versão de 1959 tornou-se a mais famosa de todas. Com razão: foi contemplada com o Oscar em nada menos que 11 categorias, e com o Globo de Ouro em três. Ben Hur é o épico dos épicos da era de ouro de Hollywood. Sem exagero, o filme é glorioso. A cena da corrida de bigas é uma das famosas de toda a história do cinema. As interpretações são ótimas. Charlton Heston, que fez o personagem-título, era muito bom como ator dramático. É bem verdade que seu fenótipo nórdico não se enquadra de jeito nenhum no padrão físico dos judeus do primeiro século. Mas o filme mereceu o sucesso tremendo que teve: figurino, trilha sonora, roteiro, direção, e, por último, mas não menos importante, um enredo muito bom.
É 
preciso que um diretor tenha muita coragem para fazer um remake de um 
filme de sucesso estrondoso como este. Mas foi exatamente esta a 
empreitada corajosa assumida pelo diretor cazaque Timur Bekmambetov. 
Dele eu já havia assistido Abraão Lincoln: Caçador de Vampiros, de 2012,
 a versão cinematográfica do livro com o mesmo título de Seth 
Grahame-Smith, talvez uma das estórias mais bizarras de todos os tempos 
(li o livro e vi o filme exatamente por conta do seu altíssimo grau de 
bizarrice, algo tão estranho que me chamou a atenção). 
E agora Bekmambetov se lançou à tarefa de recontar a história tantas vezes contada de Lewis Wallace. E o fez de maneira muito inteligente, pois conseguiu produzir um filme que ao mesmo tempo se aproxima e se distancia do filme de Wyler. Pois as comparações entre as duas versões são inevitáveis. Como não li o livro, não posso dizer qual das versões lhe é ou não a mais fiel. O que pretendo é mostrar algumas impressões da versão do cineasta cazaque.
 Se
 o filme de 1959 é um épico, o de 2016 é um filme de ação. A cena da 
batalha naval por exemplo, na versão de Bekmambetov é muito mais longa 
que na do filme de Wyler (e, claro, muito mais bem filmada, considerando
 os recursos de tecnologia de filmagem deste início de século XXI que 
nem sequer eram imaginados quando o filme de Wyler foi produzido). As 
ênfases são muito diferentes: na versão de 1959 a ênfase está na 
vingança, enquanto que na de 2016, na reconciliação e no perdão. O Ben 
Hur de Bekmambetov é encarnado pelo ator inglês Jack Huston, que faz o 
príncipe judeu doce e meigo (sem ser afeminado). O romano Messala é 
vivido pelo também inglês Toby Kebbell (Kebbell, um Milhem Cortaz 
melhorado, conseguiu se redimir de sua péssima atuação como Dr. Destino 
no reboot de O Quarteto Fantástico de 2015). No filme de Wyler, Ben Hur e
 Messala são amigos, enquanto que no filme de Bekmambetov, são irmãos 
adotivos (assim apagou-se qualquer alusão ou referência à paixão 
homoafetiva do romano Messala pelo príncipe judeu, presente no filme de 
1959). Enquanto o Messala de Stephen Boyd é sádico, o de Kebbell é 
fraco, sem coragem de tomar decisões ou assumir posturas na vida. O 
senador romano que adota Judah Ben Hur como filho adotivo, em gratidão 
por ter este salvado sua vida simplesmente não existe no filme de 
Bekmambetov. O personagem que ocupa seu lugar na versão de 2016 é o 
mercador africano vivido pelo excelente Morgan Freeman, que se veste 
como um potentado árabe das 1001 Noites. Ele é quem vai dar a Ben Hur a 
chance de participar da corrida de bigas contra Messala, que a esta 
altura já era o campeão romano.
Se
 o filme de 1959 é um épico, o de 2016 é um filme de ação. A cena da 
batalha naval por exemplo, na versão de Bekmambetov é muito mais longa 
que na do filme de Wyler (e, claro, muito mais bem filmada, considerando
 os recursos de tecnologia de filmagem deste início de século XXI que 
nem sequer eram imaginados quando o filme de Wyler foi produzido). As 
ênfases são muito diferentes: na versão de 1959 a ênfase está na 
vingança, enquanto que na de 2016, na reconciliação e no perdão. O Ben 
Hur de Bekmambetov é encarnado pelo ator inglês Jack Huston, que faz o 
príncipe judeu doce e meigo (sem ser afeminado). O romano Messala é 
vivido pelo também inglês Toby Kebbell (Kebbell, um Milhem Cortaz 
melhorado, conseguiu se redimir de sua péssima atuação como Dr. Destino 
no reboot de O Quarteto Fantástico de 2015). No filme de Wyler, Ben Hur e
 Messala são amigos, enquanto que no filme de Bekmambetov, são irmãos 
adotivos (assim apagou-se qualquer alusão ou referência à paixão 
homoafetiva do romano Messala pelo príncipe judeu, presente no filme de 
1959). Enquanto o Messala de Stephen Boyd é sádico, o de Kebbell é 
fraco, sem coragem de tomar decisões ou assumir posturas na vida. O 
senador romano que adota Judah Ben Hur como filho adotivo, em gratidão 
por ter este salvado sua vida simplesmente não existe no filme de 
Bekmambetov. O personagem que ocupa seu lugar na versão de 2016 é o 
mercador africano vivido pelo excelente Morgan Freeman, que se veste 
como um potentado árabe das 1001 Noites. Ele é quem vai dar a Ben Hur a 
chance de participar da corrida de bigas contra Messala, que a esta 
altura já era o campeão romano.
Outra diferença notável está na presença de Jesus: na versão de 1959 ele aparece duas vezes apenas, e seu rosto nunca é mostrado. Em contraste notável, na de 2016 Jesus aparece muito. Bom
 ver o brasileiro Rodrigo Santoro com tanto prestígio em Hollywood: o 
Jesus de Santoro tem muitas falas. Impossível não notar que é um Jesus 
mais imanente que transcendente, um Jesus que não faz milagres. Na 
verdade, ele os faz, mas de um modo totalmente diferente: ele ensina a 
superação da vingança e do ódio pela força do amor e do perdão. O Jesus 
de Bekmambetov não cura o leproso, mas o abraça e leva pedradas junto 
com ele. É assim um Jesus solidário com os homens, solidariedade levada 
às últimas consequências. Ninguém poderá negar que a ênfase na 
solidariedade de Jesus conosco é bíblica.
Bom
 ver o brasileiro Rodrigo Santoro com tanto prestígio em Hollywood: o 
Jesus de Santoro tem muitas falas. Impossível não notar que é um Jesus 
mais imanente que transcendente, um Jesus que não faz milagres. Na 
verdade, ele os faz, mas de um modo totalmente diferente: ele ensina a 
superação da vingança e do ódio pela força do amor e do perdão. O Jesus 
de Bekmambetov não cura o leproso, mas o abraça e leva pedradas junto 
com ele. É assim um Jesus solidário com os homens, solidariedade levada 
às últimas consequências. Ninguém poderá negar que a ênfase na 
solidariedade de Jesus conosco é bíblica. 
Como dito acima, a grande ênfase no Ben Hur de 2016 está na busca da reconciliação e do perdão. O príncipe judeu na versão de Bekmambetov é um humanista pacifista. Ele crê piamente na possibilidade dos diferentes viverem unidos, a despeito de diferenças culturais ou religiosas. Neste sentido, o filme é a demonstração de uma grande utopia, a utopia em que a alteridade é levada a sério, em que o outro é respeitado. Mas uma palavra crítica precisa ser dita: o filme quase resvala para um final piegas demais na última cena, em que inexplicavelmente (e de modo um tanto ridículo) se ouve uma música contemporânea. Esta cena ficou muito “nada a ver”.
Na Jerusalém do tempo de Ben Hur judeus e romanos vivem uma relação de ódio e tensão constante. Dois mil anos depois, a situação de tensão continua: agora, entre israelenses e palestinos. A necessidade de perdão e reconciliação continua tão necessária como sempre. O filme de Timur Bekmambetov ajuda a pensar no sonho de um mundo em que barreiras de separação são derrubadas, e que em lugar destas, os homens construam pontes.
 
Carlos R. Caldas Filho
É doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e bolsista do PNPD-CAPES na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte (MG).
E agora Bekmambetov se lançou à tarefa de recontar a história tantas vezes contada de Lewis Wallace. E o fez de maneira muito inteligente, pois conseguiu produzir um filme que ao mesmo tempo se aproxima e se distancia do filme de Wyler. Pois as comparações entre as duas versões são inevitáveis. Como não li o livro, não posso dizer qual das versões lhe é ou não a mais fiel. O que pretendo é mostrar algumas impressões da versão do cineasta cazaque.
Outra diferença notável está na presença de Jesus: na versão de 1959 ele aparece duas vezes apenas, e seu rosto nunca é mostrado. Em contraste notável, na de 2016 Jesus aparece muito.
Como dito acima, a grande ênfase no Ben Hur de 2016 está na busca da reconciliação e do perdão. O príncipe judeu na versão de Bekmambetov é um humanista pacifista. Ele crê piamente na possibilidade dos diferentes viverem unidos, a despeito de diferenças culturais ou religiosas. Neste sentido, o filme é a demonstração de uma grande utopia, a utopia em que a alteridade é levada a sério, em que o outro é respeitado. Mas uma palavra crítica precisa ser dita: o filme quase resvala para um final piegas demais na última cena, em que inexplicavelmente (e de modo um tanto ridículo) se ouve uma música contemporânea. Esta cena ficou muito “nada a ver”.
Na Jerusalém do tempo de Ben Hur judeus e romanos vivem uma relação de ódio e tensão constante. Dois mil anos depois, a situação de tensão continua: agora, entre israelenses e palestinos. A necessidade de perdão e reconciliação continua tão necessária como sempre. O filme de Timur Bekmambetov ajuda a pensar no sonho de um mundo em que barreiras de separação são derrubadas, e que em lugar destas, os homens construam pontes.
Carlos R. Caldas Filho
É doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e bolsista do PNPD-CAPES na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte (MG).
FONTE:
http://www.ultimato.com.br/conteudo/ben-hur-reconciliacao-e-perdao-ou-vinganca
 
 
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