" O homem verdadeiramente humilde não espera encontrar virtude em si mesmo"
A humildade é algo absolutamente indispensável para o cristão. Sem ela, não pode haver conhecimento de si mesmo, nem arrependimento, nem fé, nem salvação. As promessas de Deus são dirigidas aos humildes; o homem orgulhoso, com seu orgulho perde o direito a todas as bênçãos prometidas aos humildes de coração, e não pode esperar da mão de Deus outra coisa senão juízo. Contudo, não devemos esquecer que há uma falsa humildade que se distingue da real, e que no geral existe entre os crentes, sem que se deem conta de que é falsa.
A humildade verdadeira é algo saudável. O homem humilde aceita que se lhe diga a verdade. Ele crê que em sua natureza caída não habita bem nenhum. Reconhece que, separado de Deus, não é nada, não tem nada, não sabe nada, nem pode fazer nada. Mas esse conhecimento não o desanima, porque também sabe que, em Cristo, ele é alguém. Sabe que para Deus ele é mais precioso que a menina dos seus olhos, e que pode todas as coisas por meio de Cristo, que o fortalece; ou seja, pode fazer tudo o que está dentro da vontade de Deus que ele faça.
A pseudo humildade é, na realidade, simplesmente orgulho com outra cara. Faz-se evidente na oração do homem que se condena diante de Deus como fraco, pecador e néscio, mas que se ofenderia e lhe causaria raiva se sua esposa dissesse essas mesmas coisas dele. Não é que esse homem seja necessariamente um hipócrita. A oração de auto condenação pode ser completamente sincera, como também o pode ser sua defesa própria, embora ambas pareçam contradizer-se mutuamente. A semelhança entre as duas é que ambas nasceram dos mesmos pais: o pai é o amor próprio e a mãe é a confiança em si mesmo.
O homem cheio de autoestima espera de forma natural grandes coisas de si mesmo, e se sente amargamente desanimado quando fracassa. O crente que tem autoestima tem os mais elevados ideais morais: chegará a ser o homem mais santo de sua igreja, se não o mais santo de sua geração. É possível que fale da depravação total, da graça e da fé, enquanto ao mesmo tempo inconscientemente está confiando em si mesmo, promovendo-se a si mesmo e vivendo para si mesmo. Como tem aspirações tão nobres, qualquer falha em alcançar seus ideais o enche de desânimo e desgosto. Vem, então, a dor da consciência, que ele erroneamente interpreta como evidência de humildade, mas que na realidade só é uma amarga negativa de perdoar-se a si mesmo por haver caído da alta opinião que tinha de sua própria pessoa.
Às vezes se pode traçar um paralelo com a pessoa do pai orgulhoso e ambicioso que espera ver no filho o tipo de homem que ele havia esperado ser e não é, e que quando o filho não vive de acordo com suas expectativas não quer perdoá-lo. A dor do pai não vem do seu amor pelo filho, mas de seu amor por si próprio. O homem verdadeiramente humilde não espera encontrar virtude em si mesmo, e quando não a encontra, não se desanima. Ele sabe que qualquer boa obra que poderia fazer é resultado da obra de Deus nele, e se é obra própria sua sabe que não é boa, por melhor que pareça. Quando essa crença se torna parte desse homem, algo que opera como uma espécie de reflexo subconsciente, ele se vê liberto do peso de viver segundo a opinião que tem de si mesmo. Pode descansar e contar com o Espírito para que cumpra a lei moral em seu íntimo. Muda-se o centro de sua vida, do ego para Cristo, que é onde deveria Ter estado desde o princípio, e assim se vê livre para servir a sua geração de acordo com a vontade de Deus, sem os milhares de empecilhos que antes tinha. Se um homem assim falha para com Deus de alguma forma, lamenta-o e se arrepende, mas não passa os dias castigando-se a si mesmo por seu fracasso. Dirá com o Irmão Lourenço: "Nunca poderei agir de outra forma se me deixas só; Tu és aquele que deve impedir minha queda e emendar o que é mau", e depois disso "não continuará se torturando pelo acontecido". Quando lemos sobre a vida e os escritos dos santos, é que a falsa humildade mais entra em ação. Lemos Agostinho e percebemos não ter sua inteligência; lemos Bernardo de Claraval e sentimos um calor em seu espírito, que não encontramos em nosso próprio em um grau que sequer se lhe assemelhe; lemos o diário de George Whitefield e temos de confessar que comparados com ele somos simples principiantes, noviços espirituais, e que apesar de nossas "vidas tão supostamente ocupadas" vemos muito pouco ou nada realizado. Lemos as cartas de Samuel Rutherford e sentimos que seu amor por Cristo ultrapassa tanto o nosso, que seria estupidez sequer mencioná-los ao mesmo tempo. É então que a pseudo humildade começa a trabalhar em nome da autêntica humildade e nos leva até o pó numa confusão de auto compaixão e auto condenação. Nosso amor próprio se volta contra nós mesmos e com grande azedume nos joga em rosto nossa falta de piedade. Sejamos cuidadosos com isso. Aquilo que achamos ser penitência pode facilmente ser uma pervertida forma de inveja e nada mais. É possível que simplesmente estejamos invejando esses poderosos homens, e desanimemos de chegar a ser como eles, imaginando que somos muito santos porque nos sentimos humilhados e desanimados.
Tenho conhecido duas classes de crentes: os orgulhosos que se consideram humildes, e os humildes que têm medo de ser orgulhosos. Deveria haver outra classe: os desesperados de si mesmos que deixam todo o assunto nas mãos de Cristo, e se negam a gastar o tempo tentando fazer-se bons. Serão esses os que alcançarão o alvo, e bem antes que os demais.
FONTE:
A. W. Tozer : Extraído do livro “God Tells the Man Who Cares”
Extraído do livro “God Tells the Man Who Cares”, capítulo 33.
Tradução: Helio Kirchheim
Tradução: Helio Kirchheim
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