Um grupo cada vez maior de pesquisadores acha que estamos nos tornando mais distraídos – e mais burros – por causa do uso excessivo de aparelhos digitais
PREÇO ALTO
O biólogo Hebert Campos, em Campina Grande.
A internet abriu seus horizontes e acabou com sua concentração.
“Perco de um lado, mas ganho do outro” (Foto: Kleide Teixeira/ÉPOCA)
O escritor
americano Nicholas Carr sentiu que algo estranho ocorria com ele há
uns cinco anos. Leitor insaciável, percebeu que já não era capaz de se
concentrar na leitura como antes. Na verdade, sua ansiedade disparava
diante de qualquer tarefa que exigisse concentração – seus olhos
procuravam a tela do computador ou do celular.
O impulso de espiar na internet
era quase incontrolável, diz ele. “Sentia que estava forçando meu
cérebro a voltar para o texto”, afirma. “A leitura profunda, antes tão
natural para mim, tinha se transformado numa luta.”
Tal afirmação abre o livro The shallows – What the internet is doing to our brains (Os superficiais – O que a internet está fazendo com nossos cérebros,
ainda sem tradução no Brasil). Nele, Carr faz uma acusação seriíssima:
a exposição constante às mídias digitais está mudando, para pior, a
forma como pensamos.
Ele e um punhado de autores
respeitáveis acreditam que, por causa do uso excessivo de computadores e
de outros aparelhos digitais, nosso cérebro é alterado e estamos nos
tornando menos inteligentes, mais superficiais e imensamente distraídos
– o inverso de tudo aquilo que fez de nós a espécie mais bem-sucedida
do planeta Terra.
“Em vez de mentes juvenis
inquietas e repletas de conhecimento, o que vemos nas escolas é uma
cultura anti-intelectual e consumista, mergulhada em infantilidades e
alheia à realidade adulta”, afirma Mark Bauerlein, autor de The dumbest generation (A geração mais estúpida).
No livro, ele antecipa uma nova
Idade das Trevas, quando os indivíduos que hoje são crianças e
adolescentes chegarem à maturidade.
Bauerlein,
professor na Universidade Emory, na Geórgia, supervisiona estudos
sobre a vida cultural americana. Ele acredita que as novas gerações,
educadas sob a influência das mídias digitais, são formadas por
narcisistas despreparados para pensar em profundidade sobre qualquer
assunto.
Ele diz que uma pesquisa de 2006
com mais de 81 mil estudantes americanos de ensino médio detectou que
90% deles “leem ou estudam” menos de cinco horas por semana – embora
passem “pelo menos” seis horas navegando na internet e um período
equivalente assistindo à TV ou jogando videogame. “Indivíduos que não
sabem praticamente nada de história, que nunca leram um livro nem
visitaram um museu não têm mais do que se envergonhar. Tornaram-se
comuns”, afirma.
Leia a matéria na íntegra abaixo
Carr e Bauerlein não estão
sozinhos. A jornalista Maggie Jackson, outra autora crítica da
tecnologia, sugere que os mais jovens estão acostumados, por culpa da
internet e do uso de celulares, à leitura desatenta de textos cada dia
mais breves e estilisticamente mais pobres. Os 140 caracteres que se
podem escrever no Twitter, ela acredita, geram pensamentos máximos de
140 caracteres. Parece exagero, mas alguns estudos mostram que há
motivos para preocupação.
Uma consultoria chamada Genera
divulgou um estudo alarmante sobre os efeitos do uso da internet entre
os jovens. A empresa entrevistou 6 mil pessoas da geração que cresceu
usando a internet e concluiu que as coisas estão mudando radicalmente.
“A imersão digital afetou até
mesmo a forma como eles absorvem informação”, afirmam os pesquisadores.
“Eles não leem uma página necessariamente da esquerda para a direita e
de cima para baixo. Pulam de uma palavra para outra, atrás de
informação pertinente.”
Um efeito disso já foi notado
por um professor da Universidade Duke. Ele reclamou com o autor de The
shallows que não consegue mais que seus alunos leiam um único livro do
começo ao fim, mesmo nos cursos de literatura.
GERAÇÃO VELOZ
Jovens chineses jogam on-line e navegam na internet num cibercafé na província de Hubei. O cérebro parece se adaptar ao ritmo do computador (Foto: Imaginechina/Corbis)
Se as críticas ao uso dos
computadores partissem apenas de intelectuais preocupados com a ruptura
de padrões tradicionais, não haveria problemas. Professores se
queixando da preguiça de seus alunos era comum nos séculos XX e XIX e,
certamente, antes disso.
Esse tipo de evidência
circunstancial pode ser facilmente contestado por exemplos contrários,
que existem abundantemente, mostrando que há milhões de jovens
concentrados que leem e estudam com afinco. Mas os críticos vão além
das velhas reclamações. Experimentos como o do professor de comunicação
Clifford Nass, da Universidade Stanford, são mais difíceis de
rechaçar.
Eles sugerem que pessoas
acostumadas ao funcionamento multitarefa do computador – que permite
fazer várias coisas ao mesmo tempo – tendem a imitar a máquina, tocando
várias atividades ao mesmo tempo. Escrevem, falam ao telefone,
consultam a internet, ouvem música. Tudo simultaneamente, ou quase. As
consequências são perversas. Elas erram, ficam irritadas por quase nada
e qualquer estímulo as distrai.
O estudo mostra que, quanto
mais a pessoa se julga eficiente fazendo várias coisas ao mesmo tempo,
pior ela as faz. E, quando é necessário que se concentrem numa única
atividade por longo tempo, elas precisam de muito mais esforço.
A Associação Americana de
Psicologia define multitarefa como “a tendência a fazer mais de um
trabalho que precise de atenção ao mesmo tempo, como falar ao telefone e
escrever uma mensagem eletrônica”. Ela diz que esse hábito promovido
pelas novas tecnologias tornou-se um problema. Sério.
O motivo é simples: nossa
capacidade de atenção é limitada. Quanto mais ela é fracionada, menos
funciona. É um problema que tem origem na evolução da espécie. Fazemos
bem uma coisa de cada vez e, mesmo assim, com grau limitado de
concentração.
Apesar disso, estamos nos
dividindo cada vez mais. Entre 2008 e 2009, um estudo da Basex, uma
companhia americana especializada em consultoria para grandes empresas,
concluiu que um trabalhador médio passa mais de um quarto de sua
jornada diária lidando com distrações do mundo real (ligações de
telefone, conversas com colegas) e virtuais (e-mails, chats).
Outro estudo, de RescueTime,
revelou que, em média, um funcionário que usa o computador o tempo todo
acessa 50 vezes por dia a caixa de e-mails, 77 vezes programas de
comunicação instantânea (MSN ou Google Talk) e 40 vezes as páginas da
internet.
O custo em atenção e
produtividade é imenso. Os pesquisadores dizem que, cada vez que
interrompemos uma tarefa, ao voltar a ela podemos demorar mais de dez
vezes o tempo da interrupção para retomar a atenção inicial.
O
gaúcho Gérson Worobiej, de 42 anos, analista de custos em Porto
Alegre, sabe o que isso significa. Ele diz que a desorganização de sua
mesa migrou do papel para a tela.
Gastava longos minutos para
achar um arquivo perdido na caixa de e-mails – e, enquanto o computador
buscava, aproveitava para ler coisas na internet.
Quando se dava conta, os
minutos já tinham virado hora, e ele estava atrasado. Para tentar dar
conta das tarefas, abria um grande número de janelas.
Geralmente, tinha a sua frente a
tela do e-mail, três planilhas diferentes e ainda o navegador, para os
momentos em que queria espairecer. Quanto mais fazia, menos produtivo
ficava.
O antídoto para o problema de
Gérson começou a vir do próprio computador. Ele usou a internet para
pesquisar programas que pudessem ajudá-lo a se organizar. E encontrou.
Hoje, a primeira coisa que faz no dia é planejar tudo, dentro do programa de gerenciamento de tempo.
Fica menos ligado no e-mail porque desligou o alerta automático de mensagens e passou a controlar seus acessos à internet.
Também reduziu o número de janelas e tenta fazer uma coisa de cada vez. “Hoje, sou mais produtivo e trabalho menos”, afirma.
Existe o temor, entre os
pesquisadores, de que a insistência em comportamentos digitais
obsessivos possa causar danos ou alterações neurológicos.
Num estudo publicado pela
revista eletrônica PlusONE, em junho deste ano, cientistas chineses
analisaram a atividade cerebral de 18 adolescentes que passavam mais de
dez horas por dia jogando na internet.
Eles descobriram que regiões
cerebrais encarregadas do autocontrole e da capacidade de concentração
numa única tarefa e de evitar distrações apresentavam um tamanho menor
que a média. Os jovens mostravam também desempenho pior de memória.
O professor Karl Friston, do
University College London, diz, porém, que os resultados da pesquisa
chinesa não são conclusivos, por dois motivos.
Primeiro, porque os jovens estudados são viciados que fogem ao padrão de uso geral da tecnologia.
Segundo, porque a pequena quantidade de participantes não permite extrapolar os resultados para a população em geral.
Outras pesquisas, porém, estão detectando que quem usa demais a tecnologia sofre limitações em relação aos demais.
Depois de colocar 100 estudantes
para realizar um monte de testes, Nass, de Stanford, concluiu que os
usuários mais intensos de tecnologia pagam um preço elevado por seus
hábitos.
“Eles são atraídos por irrelevâncias”, diz o pesquisador. “Qualquer coisa os distrai.”
Nos testes de atenção, em que
se mede a capacidade de separar e filtrar informação, os tipos
multitarefa se deram muito pior do que quem usa tecnologia com
moderação. No teste seguinte, de memória, eles também tiveram
desempenho relativamente pobre.
Quanto mais elementos para
memorizar, mais eles se afundavam. Surpresos, os cientistas
desenvolveram um terceiro teste, para descobrir se os nerds eram bons
pelo menos em saltar rapidamente de uma atividade para outra. Nem nisso
eles se mostraram melhores.
“Eles não conseguiam se desligar
da tarefa que estavam executando pouco antes”, afirma o professor Eyal
Ophir, que conduziu os experimentos. “Os multitarefas não conseguem
manter as coisas separadas no interior da mente.”
No cérebro dos jovens viciados em jogos, a área responsável pela concentração é menor que a média
A explicação para isso, segundo
os críticos da tecnologia, está no conceito de neuroplasticidade – uma
palavra difícil que significa, essencialmente, a capacidade dos
neurônios de criar novas conexões ou de reforçar as já existentes, em
resposta às experiências do dia a dia.
Alguns cientistas temem que, por
meio da neuroplasticidade, a arquitetura do cérebro dos usuários de
tecnologia seja irremediavelmente alterada. A verdade parece ser menos
alarmante.
Um exemplo é o resultado de um
estudo que comparou o comportamento de três pessoas não acostumadas a
usar a internet (chamadas “imigrantes digitais”) com o de três
indivíduos que tinham crescido entre computadores (os “nativos
digitais”).
Os pesquisadores pediram aos
dois grupos que fizessem uma busca no Google e navegassem pelos
resultados enquanto a atividade de seus cérebros era monitorada. O
resultado mostrou que os nativos digitais completavam com mais rapidez a
tarefa encomendada pelo pesquisador.
Ficou claro também que uma área
do cérebro relacionada ao planejamento de atividades conscientes se
ativava com maior intensidade no cérebro dos nativos digitais. Até aí,
nada demais. A novidade é que, depois de cinco dias, o cérebro dos
imigrantes começou a se comportar de forma parecida com o dos nativos
digitais.
A neuroplasticidade tinha entrado em ação.
Apresentado
pelos críticos da tecnologia como surpreendente – e até mesmo
assustador –, o resultado desse experimento é, na verdade, trivial.
Quem aprendeu a dirigir sabe como é.
Nos primeiros dias ao volante,
tudo parece novo e difícil. Depois, o ato torna-se mecânico. Os
cálculos de tempo e distância que pareciam antinaturais são
internalizados. O cérebro cria novas conexões entre os neurônios e muda
em função do aprendizado.
As pessoas dizem que aprenderam,
não que seu cérebro foi alterado. Mas a verdade é que o cérebro mudou.
Que ele seja modificado pela tecnologia não constitui, portanto,
motivo de alarme. Ele se modifica o tempo todo, em resposta a quase
tudo.
Há outros motivos para não se
preocupar em demasia com as transformações do cérebro. Em primeiro
lugar, porque elas parecem ser reversíveis. Do mesmo jeito que os
neurônios criam conexões novas o tempo todo, essas conexões podem
também se enfraquecer pela falta de uso.
Alguém que mude os hábitos de
uso de tecnologia pode voltar a ter um cérebro “normal” – como explica o
neurocientista português António Damásio, um dos maiores especialistas
mundiais no assunto. “Para conseguir processar, analisar e responder à
grande quantidade de informações do mundo virtual, o cérebro precisa
se adaptar a seu tempo acelerado”, afirma Damásio (leia seu artigo
exclusivo na página 80).
Ele dá conta do recado por ser
plástico e adaptável às novas condições, ainda que cobre um preço na
redução da capacidade de concentração. “Mas a dificuldade de
concentração não é irreversível.
Acreditar nisso é bobagem.
Qualquer criança e adolescente com um nível de inteligência normal é
capaz de aprender a se concentrar e desenvolver os mesmos padrões de
atenção e reflexão das gerações de seus pais e avós”, diz Damásio.
Embora esteja claro que a
neuroplasticidade é uma via de mão dupla – ela modifica o cérebro, mas
permite que ele seja modificado de volta –, ainda há confusão sobre o
que realmente é possível alterar no cérebro humano pelo uso da
tecnologia.
O psicólogo Steven Pinker, autor
de livros fundamentais sobre o funcionamento da mente humana, insiste
que o cérebro não é uma massa de argila inteiramente moldável. “A
experiência não redesenha nossas capacidades básicas de processamento
de informação”, diz Pinker.
As pessoas podem se educar para
ler mais rápido na internet, mas os resultados serão limitados pela
estrutura do cérebro e dos neurônios. Chega um ponto em que as mudanças
cessam, por mais impulsos que venham do mundo exterior – da tecnologia
ou de qualquer outra área.
MENOS É MAIS
O analista de custos Gérson Worobiej, de Porto Alegre, no computador do trabalho. Ele fazia tudo ao mesmo tempo com baixa produtividade (Foto: Ricardo Jaeger/ÉPOCA)
A professora Andréa Jotta,
pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Psicologia em Informática da PUC
de São Paulo, duvida até mesmo que haja mudanças reais na cognição
humana por causa dos computadores. “As pessoas não perderam a
capacidade de se concentrar. O que vemos aqui é um excesso de foco no
mundo digital”, diz ela.
Há quem entre tão fundo no
mundo virtual que se esquece do real a sua volta. Em um dos casos
estudados por ela, o paciente via pornografia na baia de trabalho,
alheio ao fato de estar em um lugar público. Em outros, as pessoas
deixavam de dormir ou ir ao banheiro para não largar um jogo. “A
concentração parece estar ali, mas o foco está voltado para outras
coisas”, afirma.
Ainda que a internet cobre um
preço de seus usuários, como afirma o neurocientista Damásio, as
críticas a seu uso ignoram um efeito positivo de sua disseminação: a
conexão intelectual de milhões de pessoas que, de outra forma, não
seria possível. Ela tem potencial de mexer com a inteligência do
planeta inteiro.
As redes sociais às quais nos
integramos – reais ou virtuais – exercem uma influência considerável
sobre nosso desenvolvimento individual. Como sabem os pedagogos, um
ambiente estimulante aumenta a possibilidade de que a inteligência se
desenvolva.
Muitas das grandes ideias não
nasceram de mentes privilegiadas trabalhando em laboratórios
silenciosos. Nas palavras de Steven Johnson, autor de De onde vêm as
boas ideias, elas “emergem de espaços de conexões, da colisão entre
diferentes visões, sensibilidades e especializações”.
Não é por acidente que a maior
parte da inovação científica e tecnológica do último milênio tenha sido
produzida em centros urbanos abarrotados e cheios de distrações. Em
outras palavras, a inteligência parece ser contagiosa. No século XXI, a
internet pode ser o vetor de contágio.
Os neurologistas dizem que a perda de concentração causada pela internet não é irreversível ”
Há até um grupo que defende uma ideia à
primeira vista delirante: a conexão de bilhões de pessoas à internet
permitirá a emergência, no futuro, de uma espécie de inteligência em
rede, capaz de transcender o potencial de cada um de seus nós.
O jornalista e escritor Kevin
Kelly, um dos fundadores da futurista revista Wired, acredita que a
tecnologia segue as regras da evolução natural e evolui em simbiose com
o ser humano.
No futuro, ele enxerga uma fusão
total do ser humano com as máquinas, até que uns sejam indistintos dos
outros. Kelly chama o aglomerado de tecnologias físicas (ferramentas) e
conceituais (ideias) de “Technium”.
Não é preciso partilhar essa visão fantasiosa para entender o lado positivo da conexão humana por meio da internet.
O biólogo Hebert Bruno Campos,
de Campina Grande, na Paraíba, é um óbvio beneficiário dessas conexões.
Aos 28 anos, ele mora com os pais e dois irmãos.
A proximidade da Chapada do
Araripe, um dos mais ricos sítios de fósseis do país, fez com que
Hebert, desde os 7 anos, tivesse certeza do que seria quando crescesse:
paleontólogo.
Sonhar era fácil. Realizar o sonho, difícil. Ainda mais vivendo tão longe dos grandes centros do Sul e do Sudeste.
Mais complicado ainda quando se
sabe que Hebert é superdotado e tem grande dificuldade de estabelecer
relacionamentos sociais.
“Descobri a internet aos 14
anos. Minhas primeiras amizades foram feitas via internet”, diz ele.
“Minha adolescência foi vivida na frente do computador.”
Agora, Hebert se prepara para
ingressar no mestrado em paleontologia. Graças à internet, conseguiu
fazer amigos que o visitam em casa.
Mas há um preço. Ele admite que
a ultraexposição à internet – que o ensinou a fazer várias coisas ao
mesmo tempo – também ajudou a torná-lo ansioso e dispersivo.
“As ferramentas digitais me
tiraram do isolamento e me conectaram com o mundo. Permitiram que eu
conhecesse paleontólogos brasileiros e estrangeiros”, diz ele.
“Mas, quando preciso estudar ou
ler um livro, calculo o tempo que terei de ficar desplugado da
internet. Basta ler uma página para que eu perca a concentração e
comece a pensar nas mensagens que devo ter recebido e terei de
responder.”
Hoje, ele tenta estabelecer
alguma distância dos meios digitais. Entre a tela do notebook e o
teclado do smartphone, ainda passa oito horas por dia plugado.
“Estou tentando balancear minhas duas vidas, a real e a on-line. Perco de um lado, mas ganho de outro”, afirma.
As evidências do benefício da conexão propiciada pela rede estão por toda parte.
Os maiores centros de inovação,
como o Vale do Silício, na Califórnia, Estados Unidos, surgem da enorme
concentração de gente brilhante, bem-educada e hiperconectada. As
empresas que quebram padrões são as que conseguem juntar grupos de
profissionais notáveis sob um mesmo teto.
De alguma forma, as relações que
tais indivíduos criam – dentro das empresas ou mesmo no ciberespaço –
elevam as capacidades cognitivas de todos eles. A teoria da evolução
das espécies, que o filósofo Daniel Dennett chamou de “a maior ideia
científica de todos os tempos”, não foi produto apenas dos 20 anos que
Charles Darwin passou mergulhado nos estudos práticos e teóricos da
natureza.
Beneficiou-se também da
impressionante troca de cartas que ele mantinha com colegas e amigos de
porte intelectual equivalente. Darwin parece ter escrito mais de 15
mil cartas ao longo da vida, discutindo suas ideias e seus sentimentos.
Se ele tivesse nascido no século XX, teria sido usuário ativo de
e-mail e redes sociais.
Se a exposição constante a telas
de televisão, computadores e celulares fosse capaz de emburrecer seus
usuários, seria razoável uma queda planetária no quociente intelectual
(Q.I.) nos últimos dez, 20 ou 30 anos. Mas aconteceu o contrário.
Depois de 60 anos de TV e de
mais de duas décadas de uso cotidiano da internet, o Q.I. não para de
crescer. Se um adolescente médio de hoje viajasse para o passado e
fizesse o teste de Q.I. em 1950, conseguiria um resultado de 120,
considerado elevado. Segundo cálculos de Pinker, um cidadão comum de
hoje tem Q.I. maior do que 98% das pessoas em 1910.
Se um cidadão de 1910 fizesse o
teste hoje, seu Q.I. medido pelos padrões atuais seria 70 – tão baixo
que estaria próximo do retardamento. É verdade, porém, que o Q.I. mede
um tipo específico de inteligência (lógico-racional) e não pode ser
usado, sozinho, para avaliar se a humanidade está emburrecendo ou não.
De todo modo, os apocalípticos da catástrofe digital tampouco
explicam outro fenômeno que desafia seu pessimismo: por que as
sociedades mais interconectadas do mundo são também as que apresentam
melhores índices de desempenho na educação?
Países como Dinamarca, Finlândia, Austrália e Coreia do Sul estão entre
os dez mais conectados do planeta – assim como entre os dez primeiros
no ranking de qualidade escolar da ONU. Parece que a banda larga ajuda
no desenvolvimento intelectual dos jovens – ou, pelo menos, seus
efeitos nocivos podem ser combatidos por bons professores e uma
educação sólida.
A desconfiança em relação às inovações é uma constante humana. Sempre
recebemos as novas tecnologias com um misto de esperança e receio. Há
2.400 anos, o pensador grego Sócrates temia que a escrita acabasse com a
memória das pessoas.
Ele previu que a possibilidade de registrar pensamentos por meio de
símbolos sobre uma tábua de cera levaria a um enfraquecimento da mente e
do raciocínio. O surgimento da imprensa de Gutemberg, na Europa da
Idade Moderna, provocou uma reação parecida em alguns elitistas.
Eles achavam que a difusão maciça de livros provocaria a banalização da
cultura. Aconteceu o oposto. Em retrospecto, pode-se dizer que a
difusão de conhecimento é invariavelmente um fenômeno positivo. Com a
internet, é evidente que a humanidade ganhou nesse quesito.
A dúvida diz respeito àquilo que perdemos. Algo que um dia poderá
parecer tão ridículo quanto as palavras de Sócrates sobre a escrita –
ou tão essencial quanto o resto de suas ideias.
FONTE:
http://aigrejaaogostodofregues.blogspot.com.br/2011/10/internet-esta-nos-deixando-mais-burros.html
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