Edward Donnelly
Diz-se que o ser humano possui três necessidades básicas: alimento, vestes e habitação. Estas são, com certeza, necessidades humanas básicas. Todavia, existe uma necessidade vital que evidentemente está fora da lista. “Qual é essa necessidade?” — talvez você pergunte. Ora, é a necessidade de um Salvador; é a necessidade de crer em Jesus Cristo e de se render a Ele.
Espero
que você pergunte a si mesmo: "Por que eu preciso crer em Jesus
Cristo?” Render-se a Cristo é, antes de tudo, um passo muito elevado.
Por que você deve fazê-lo? Por causa do pecado. Todos nós somos
pecadores, e Cristo veio para salvar os pecadores. Você é pecador, e
Jesus pode salvá-lo.
Para que entendamos melhor, voltemos ao
passado, a Davi, o rei de Israel, que nos ensinará a respeito do pecado.
Davi é uma pessoa bem qualificada a fazer isto, porque ele mesmo foi um
grande pecador. Ele cometeu adultério com Bate-Seba, a esposa de outro
homem. Davi a contemplou, cobiçou-a e a tomou para si — atitudes más aos
olhos de Deus. E o pior de tudo foi que ele abusou de sua posição como
autoridade sobre o esposo de Bate-Seba, ao tentar enganá-lo; e, depois
de haver falhado nisso, assassinou aquele homem.
Concluímos,
assim, que Davi foi um grande pecador — e, neste aspecto, o mais vil dos
mais vis pecadores. Mas, apesar disso, ele possui uma grande percepção
no que se refere às obras do pecado no coração do homem. Deus outorgou a
este rei do antigo Israel um entendimento tão exato e profundo, que ele
é capaz de explicar o nosso íntimo para nós mesmos. Ele nos oferece uma
percepção mais valiosa do que todos os livros sobre terapia de
comportamento que existem no mercado, hoje.
Imagine Davi
assentado em seu palácio real, em Jerusalém: um rei de caráter forte e
enérgico. Muitas vezes, como guerreiro, ele lutou e venceu com uma
simples batalha. Apesar disso, este homem valente e dinâmico poderia
estar chorando, quando escreveu as palavras deste salmo. Seus olhos
estavam vermelhos, e suas bochechas, listradas pelas lágrimas
escorridas. O que ele estava escrevendo em um tablete de cera,
utilizando um pedaço de osso ou uma lasca de madeira? Era uma carta
pedindo perdão à família do homem que ele assassinara? Não era. Talvez
era um aviso para Bate-Seba, sua companheira no adultério, dizendo-lhe
que o filhinho deles morreria? Não. O rei Davi estava escrevendo para
Deus, e suas palavras iniciais foram as seguintes:
Compadece-te
de mim, ó Deus, segundo a tua benignidade; e, segundo a multidão das
tuas misericórdias, apaga as minhas transgressões. Lava-me completamente
da minha iniqüidade e purifica-me do meu pecado.
Este é um
dos mais admiráveis diagnósticos do pecado! Nestas palavras, vemos com
muita clareza, por que necessitamos de um Salvador. Consideremos estas
palavras sob três títulos: Um Reconhecimento do Pecado, Uma Descrição do
Pecado e o Perdão do Pecado.
Reconhecimento do Pecado
As
palavras que Davi utilizou nesta passagem são as três mais comuns para
descrevê-lo: “transgressões”, “iniqüidade” e “pecado”. Ele não estava
apenas multiplicando palavras, tendo o propósito de encher espaço. Cada
uma destas palavras tem um significado distinto, e desejamos
considerá-las uma a uma.
Isto o deixa impaciente? Você acha que
estou dizendo que você não se interessa por minúcias teológicas ou pelas
variações exatas do significado? Suponha que você estivesse seriamente
enfermo e que, ao procurar seu médico, ele lhe dissesse: “Quero
explicar-lhe a sua doença: ela é constituída de três ou quatro
componentes; e você precisa conhecer claramente cada um deles”. Você
responderia: “Doutor, não tenho tempo para isso. Não tenho interesse em
detalhes médicos. Conte-me apenas o fator mais importante”? É claro que
não. Você desejaria ouvir tudo que ele tinha para dizer-lhe. Não
gostaria de perder nada, para que soubesse com exatidão o que estava
errado com você. Ora, Davi é o doutor de sua alma. Não seja impaciente
para com o diagnóstico dele. Esteja atento ao que significa cada uma
destas palavras, bem como à ordem em que elas foram utilizadas; tanto o
significado quanto a ordem são importantes.
Primeiramente, Davi falou: “Minhas transgressões”.
Esta é a palavra mais forte. Ela significa “libertar-se” ou
“apartar-se” de Deus. Foi utilizada, por exemplo, para referir-se a uma
rebelião contra um superior. Em 1 Reis 12.19, lemos: “Assim, Israel se mantém rebelado contra a casa de Davi, até ao dia de hoje”.
Aqui aparece a mesma palavra — “Israel transgrediu contra a casa de
Davi”. Davi era o senhor e o governador deles; mas os israelitas
libertaram-se da autoridade de Davi. Esta palavra é utilizada algumas
vezes no ambiente doméstico. Deus falou sobre o Israel desobediente:
“Criei filhos e os engrandeci, mas eles estão revoltados [transgrediram]
contra mim” (Is 1.2). Podemos imaginar a figura de um adolescente
empurrando para o lado os braços amáveis com os quais o pai tentava
envolvê-lo. Esta palavra expressava um pecado particularmente ímpio e
ordinário. Em Jó 34.37, lemos a respeito de alguém que “ao seu pecado
acrescenta rebelião” (transgressão).
Esta foi a primeira palavra
que Davi utilizou. Ele estava mostrando como se envergonhava da maneira
como havia se rebelado contra os mandamentos de Deus. Deus havia dito:
“Não adulterarás”; Davi, porém, tinha ignorado este mandamento. Deus
havia dito: “Não dirás falso testemunho”, Davi tinha se afastado deste
mandamento. Deus havia dito: “Não matarás”; Davi tinha quebrado este
mandamento. Com a palavra “transgressões”, ele estava reconhecendo isso.
Estava dizendo: “Senhor, eu desprezei a tua mão; libertei-me de teus
braços amáveis; rejeitei a tua autoridade; fiz a minha própria vontade.
Estas são as minhas transgressões”.
No entanto, Davi não parou aí; ele prosseguiu, dizendo: “Minha iniqüidade”.
Enquanto refletia e orava, Davi compreendeu que havia mais coisas
erradas em sua vida, além de seus pecados de adultério e de assassinato.
Ele começou a olhar para o seu íntimo, o seu coração, a sua mente e a
sua alma. A palavra “iniqüidade” significa “curvatura”; refere-se a
alguma coisa que foi curvada ou distorcida. Davi estava dizendo: “Eu não fiz somente estas coisas, mas, em meu coração,
sou hipócrita, errante. Meus pensamentos têm sido impuros, e meus
propósitos, vergonhosos. Onde eu deveria ter sido sincero e puro, fui
desonesto e perverso. No mais íntimo de meu ser, fervilham coisas vis
que amam viver e se desenvolver nas trevas profundas. Esta é a minha
iniqüidade. Sou um homem perverso e trapaceiro”. Este é um quadro
desolador. Davi não era apenas um rebelde; era também um hipócrita
enganador.
Mas Davi não parou aí. Ele prosseguiu, dizendo: “Meu pecado”. A palavra “pecado” significa apenas “errar o alvo”, quando alguém está atirando em um objeto. Significa ficar aquém do objetivo que alguém estava almejando. Juízes 20.16 refere-se a “setecentos homens escolhidos, canhotos, os quais atiravam com a funda uma pedra num cabelo e não erravam”. “Erravam”, aqui, é a mesma palavra “pecado” no texto que estamos considerando.
Você
percebeu como o entendimento de Davi a respeito de si mesmo se
aprofundou? Ele começou com seu pecado visível, que todos contemplaram.
Em seguida, ele passou para as obras distorcidas e secretas de seu homem
interior. Mas agora esquadrinha muito mais profundamente e nos diz que,
mesmo quando não havia qualquer transgressão, quando ele pensava que
estava livre da iniqüidade, ele ainda ficava aquém do alvo. Talvez Davi
estivesse lendo a Palavra de Deus, ajoelhado em oração ou oferecendo
sacrifício no templo. Mas, nessas atividades piedosas, ele errou o alvo.
Ele falhou. Ele não alcançou o padrão de Deus para a sua vida. Davi foi
um homem que começou pedindo perdão por aquilo que ele era em seu pior
estado, mas, antes de terminar, pediu perdão por aquilo que ele era no
seu melhor estado.
Com certeza, existe uma diferença entre esta
análise ampla e penetrante do pecado e as idéias superficiais que muitos
têm em nossos dias. Para a maioria, a confissão de pecado significa
pouco mais do que dizer: “Muito bem, eu fiz algumas coisas erradas no
passado. Eu não sou perfeito; ninguém é”. Porém, neste salmo,
encontramos um homem guiado pelo Espírito Santo a compreender algo a
respeito da força que o pecado tinha sobre ele — não apenas em suas
ações, mas também nas profundezas de sua personalidade. O pecado estava
contaminando e destruindo cada átomo de seu ser. “Minhas transgressões... minha iniqüidade... meu pecado.”
Este esquadrinhamento da alma se aplica a todos nós. Pois, quando as
Escrituras dizem: “Todos pecaram” (Rm 3.23), isto implica que estou
sendo descrito nestas palavras de Davi. E, assim você é também.
“Minhas transgressões.”
Quantas vezes você já fez deliberadamente aquilo que sabe estar errado?
Talvez, desde a sua infância você pensava nos mandamentos de Deus, e
eles deixaram impressões em sua consciência, ensinando-lhe a não
praticar algo, mas você seguiu adiante e praticou tal coisa. Ou, talvez,
a sua consciência estava lhe dizendo: “Não faça isso; é errado”.
Contudo, você ignorou essa influência constrangedora. Você rompeu
completamente aqueles vínculos morais, rejeitando os clamores daquilo
que você já sabia estar correto.
Talvez você seja um mentiroso ou
um trapaceiro. Quando você está preenchendo seu formulário anual de
restituição de imposto, exagera em suas despesas e diminui os seus
recebimentos. Em seu íntimo, uma voz lhe diz: “Não faça isto. Não
roubarás”. Mas você transgride. Em seu trabalho, faz promessas que não
tem a intenção de cumprir ou oferece aos clientes desculpas que são
totalmente mentirosas. É uma atitude errada mas conveniente para você;
por isso, você a pratica. Talvez você manteve relações sexuais com
alguém que não é sua esposa ou seu esposo. Aquela pessoa era proibida
para você, e você sabia disso. Todavia, a sua concupiscência o estava
guiando e você transgrediu. Talvez você tenha causado danos físicos ou
psicológicos a alguém; tenha se mostrado descuidado para com as pessoas,
ferindo-as em seu coração. Estas atitudes são “transgressões”.
Elas se encontram em seu passado e caracterizam o seu presente. Você
pode não gostar de pensar nelas, mas são inegáveis. Você transgrediu;
você se rebelou.
“Minha iniqüidade.” Você se sente
inclinado a dizer: “Eu tenho levado uma vida caracterizada por
moralidade. Sou um pessoa honesta. Nunca tive problemas com a lei, nem
jamais me dispus a quebrar as restrições da consciência. Meu
comportamento tem sido completamente respeitável”. Mas o que você diz a
respeito daquelas partes de sua vida que ninguém vê? Você não tem
praticado a sós coisas das quais ficaria envergonhado se alguém mais
soubesse? Isto é iniqüidade. O que você diz a respeito de seus
pensamentos? Se os seus pensamentos da semana que se passou pudessem ser
revelados em uma tela de cinema, para todos os seus amigos e vizinhos,
você se sentiria à vontade em permanecer e assistir com eles aos seus
pensamentos ou desejaria fugir e se esconder? Isto é iniqüidade.
Não
é verdade que existe em seu íntimo muitas coisas más e enganosas? Às
vezes, você não é invejoso? Ou sente ira e raiva pecaminosa? Em algumas
ocasiões, você não é egoísta e enganador? Não existe uma diferença entre
aquilo que o mundo vê e a pessoa que você realmente é? Isto é
iniqüidade.
“Meu pecado.” Suponhamos, por um momento,
aquilo que é impossível: alguém que, tendo uma boa consciência, lavasse
as suas mãos e dissesse: “Eu não tenho nenhum pecado em minha vida
passada ou presente. Nunca quebrei conscientemente um dos mandamentos de
Deus. Além disso, meu coração é puro, e minha mente, limpa. Não existe
um pensamento ou uma emoção dos quais eu me envergonhe no menor grau”.
Suponha a fantástica possibilidade de que tal ser humano já existiu.
Mesmo que tudo isso fosse verdadeiro, ainda haveria o pecado — o ficar
aquém do alvo. “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de
toda a tua alma e de todo o teu entendimento” (Mt 22.37). Você fez isso
hoje? É claro que não. Então, você é um pecador; não atingiu o padrão de
Deus. No melhor de nós mesmos, em nosso estado mais elevado, ficamos
aquém; todos nós ainda pecamos.
Todos nós estamos descritos
nestes versículos — você e eu. Temos de encarar o terrível fato que Davi
teve de admitir — “Pequei contra o Senhor”. Temos de chegar a um
reconhecimento de nosso pecado.
Uma Descrição do Pecado
O
que é o pecado? Deus, em sua sabedoria e amor, não se contenta em que
tenhamos uma simples compreensão intelectual do pecado. Ele deseja que o
sintamos, que provemos seu amargor, cheiremos o seu fedor. Deus quer
que ouçamos o tom agudo e discordante do nosso pecado, que irrita nossos
dentes e nossos nervos com sua horrível dissonância. Deus não quer
apenas que estejamos cientes de nosso pecado, mas também que conheçamos a
sua tolice e a sua vileza. Por isso, Davi prosseguiu na descrição de
seu pecado, utilizando três ilustrações vívidas.
Davi nos conta
que o pecado é uma dívida que precisa ser cancelada. Ele escreveu:
“Apaga as minhas transgressões”. A palavra hebraica traduzida por
“apaga” era empregada para referir-se ao ato de apagar escritos. Moisés
clamou a Deus: “Risca-me, peço-te, do livro que escreveste” (Êx 32.32).
Deus, em sua misericórdia, não respondeu essa súplica. Mas ela se refere
a algo que estava escrito, e Moisés estava pedindo que, se necessário,
seu nome fosse removido daquele livro.
Davi utilizou a palavra no
mesmo sentido. Ele viu, aberto diante de Deus, os registros do pecado
dos homens. Davi contemplou a lista de atos errados debaixo de seu nome.
Poderíamos dizer que ele viu o anjo registrador assentado, com sua
tinta indelével, escrevendo cada ofensa. Momento após momento, dia após
dia, mês após mês, ano após ano, pecado após pecado está sendo
registrado. Nenhum é esquecido; cada pecado é colocado no registro. Davi
viu esses pecados, como débitos alistados contra ele, aumentando com
regularidade freqüente e clamando por pagamento. Davi sentiu o grande
peso de sua dívida.
Infelizmente, estar em dívida é algo normal
em nossa sociedade. Para pessoas de consciência sensível, esta é uma
experiência inquietante e pode se tornar um fardo esmagador. No início
do século XX, alguns operários das minas de carvão dos Estados Unidos
recebiam um salário miserável. Todas as suas roupas e sua alimentação
tinham de ser compradas em lojas mantidas pelos donos das companhias que
os empregavam. Estas coisas eram compradas a um preço exorbitante, de
modo que os operários infelizmente caíam em dívidas, que estavam
constantemente aumentando. Juros proibitivos eram lançados sobre o
dinheiro devido, de modo que os operários se atolavam em uma areia
movediça de dívidas que estavam sempre crescendo, das quais eles nunca
poderiam se livrar. Eles diziam: “Eu vendi minha alma para a companhia”.
Nunca se livrariam daquela situação. Os credores os possuíam para
sempre.
Seu pecado é semelhante a essa situação. Todo pecado que
você tem cometido está sendo escrito no livro de Deus. Ali está o seu
pecado, contra o seu nome. Nenhum deles é esquecido, ignorado, e todos
exigem pagamento. Você não tem qualquer esperança de pagá-los, nem mesmo
de começar a pagá-los. Você é empurrado para baixo pela montanha de sua
dívida. O pecado é uma dívida que necessita ser cancelada.
O pecado também é uma sujeira que precisa ser lavada completamente. Davi escreveu: “Lava-me completamente da minha iniqüidade”.
Existem duas palavras hebraicas que transmitem a idéia de lavar. Uma
significa lavar superficialmente. Se uma pessoa tinha poeira ou uma
sujeira simples em sua mão, ela a colocava na água corrente, por um
momento, e a sujeira era removida por aquela lavagem. A outra palavra
era utilizada para se referir a uma sujeira profunda e arraigada, que
poderia ser removida somente por meio de grande esforço. Quando minha
esposa e eu vivíamos na Grécia, costumávamos ver mulheres à beira do rio
lavando roupas. As mulheres pegavam as roupas, colocavam-nas sobre uma
rocha no rio e, depois, batiam nelas com outra pedra, para remover a
sujeira. Esta foi a palavra que Davi utilizou neste salmo.
Quando
Davi suplicou que seu pecado fosse lavado, ele não estava falando sobre
a remoção de algo superficial. Todo o seu ser estava sujo, cheio do
encardido que se havia grudado aos poros de seu ser. Davi era uma coisa
impura. Uma mancha de imundície o cobria, arraigada aos poros de sua
personalidade. Seria difícil removê-la. “Lava-me completamente” — ele
suplicou. O pecado é uma sujeira que necessita ser lavada completamente.
Por fim, o pecado é uma doença que precisa ser curada. Davi orou: “Purifica-me”.
Esta palavra era utilizada no Antigo Testamento para referir-se à
purificação de alguém suspeito de lepra. A lepra era a doença mais
ameaçadora no mundo antigo, uma aflição terrível temida por todos. A
lepra significava miséria, impureza, deterioração, isolamento e morte.
Davi afirmou: “Isto é o que eu sou: um leproso horrível, enfermo e
podre”. Que autodescrição impressionante!
O que são os seus
pecados, as suas transgressões — um monte de débitos registrados contra
seu nome e dos quais o pagamento será exigido. Eles são a sujeira
arraigada que contamina tudo que você é, bem como tudo que possui. Eles
são uma doença horrível, repugnante.
Sei o que alguns de vocês
podem estar pensando: “Esta é uma conversa tipicamente religiosa, ou
seja, a linguagem exagerada que se espera ouvir de um púlpito ou de uma
propaganda política. É semelhante a assistir a uma ópera. No palco, você
vê e ouve a tragédia. Ela o comove, podendo fazê-lo chorar. Mas não é
real. Depois, você sai do teatro para a vida real, com seus amigos e
seus interesses, esquecendo-se da tristeza da ópera”. Talvez, seja assim
que você se sente a respeito do que está lendo agora. “Ora”, você pode
dizer, “isto é exagero religioso, que não deve ser levado à sério”.
Deixe-me
mostrar-lhe duas palavras que se encontram no início do salmo que
estamos considerando. São elas: “Ó Deus...” Se você realmente meditar
nelas, mudará o que estava pensando. Davi estava falando com Deus, face a
face. Ele estava lidando diretamente com o Santo Senhor do céu. Apenas
duas palavras. Davi estava ciente de seu pecado havia meses. Estava
ciente do que havia feito. Ele nos diz no Salmo 32, por exemplo, que
tinha sentido dores em sua consciência. Davi sentia-se como uma pessoa
miserável e infeliz. Somente quando Deus lhe enviou um pregador, com uma
mensagem de julgamento, Davi foi levado a compreender a completa
seriedade da situação em que se encontrava.
Meu amigo, isso é o
que eu desejo que você faça. Diga: “Ó Deus”. Esqueça o seu vizinho e a
sua circunstância. Pense apenas em você mesmo e em Deus. Veja-se a si
mesmo na presença dEle. Olhe para você mesmo com os olhos de Deus — o
Deus que o criou e que, no mais íntimo de seu coração, você sabe que
existe. Um dia você se encontrará face a face com este Deus, e Ele o julgará. Ele é puro, santo e justo. Deus se recorda de cada coisa que
você já disse, pensou e fez. Ele as avalia de acordo com a sua
santidade, pura e perfeita. Deus odeia o pecado com todo o seu Ser
poderoso. Ele é fogo consumidor, que não inocentará o culpado.
Olhe
para Ele novamente e diga: “Ó Deus”. Você tem fugido de Deus, e o mundo
está fazendo o melhor que pode para mantê-lo distante dEle. Entretanto,
você tem de colocar-se face a face com Ele agora, pois, do contrário,
terá de fazê-Lo, quando morrer, mas será tarde demais.
Portanto, meu amigo, seja honesto! Encare estas verdades com seriedade! Você está face a face com o todo-poderoso Perscrutador dos corações. Sua rebelião, sua corrupção, seu erro, sua dívida, sua imundície, sua lepra — você não sente as dores em sua alma, o impacto de tudo isso, a vergonha de saber que você é assim?
Mas, agradeça a Deus, essa não é a mensagem final de nosso salmo!
O Perdão do Pecado
Este
devedor impuro e enfermo rasteja na presença do Santo Senhor – este
rebelde, este hipócrita, este patético fracasso que nunca, em sua vida,
atingiu os padrões de Deus. Este devedor se ajoelha diante daquele
radiante e todo-poderoso Espírito, que é perfeito e pureza infinita, e
fala com Deus. Que palavras você acha que se encontram em seus lábios?
O
devedor não suplica por justiça. Não é isto mesmo que muitas pessoas
parecem desejar? Elas estão constantemente se queixando da aparente
injustiça de Deus. Perguntam a si mesmas e argumentam: “Por que Deus
permite guerras, doenças e tristezas no mundo? Não posso entender como
Ele pode ser tão injusto”. Mas Davi, em seu pecado, não estava
procurando por justiça.
“Compadece-te de mim, ó Deus” — ele orou.
“Compadece-te; compadece-te”. Isso é tudo que alguém pode suplicar a
Deus. Não importa o quanto vivemos, o quanto progredimos mesmo como
crentes, não podemos ir além desta palavra: “Compadece-te!”
Podemos imaginar Deus se achegando a Davi e respondendo: “Davi, por que eu devo manifestar-lhe compaixão? Você é um transgressor. Está cheio de iniquidade; é um pecador. Você condenou a si mesmo, com seus próprios lábios. Dê-me apenas uma razão para que Eu, o Deus santo, deva mostrar compaixão para uma pessoa como a que você mesmo reconhece ser. Você tem alguma razão, Davi?” E Davi abre seus lábios, com seu rosto manchado de lágrimas e uma voz trêmula, respondendo: “Sim, Senhor, eu tenho uma razão. Tenho uma razão poderosa e persuasiva. Esta razão, ó Deus, não se fundamenta naquilo que eu sou, e sim naquilo que Tu és. É uma razão que o Senhor tem de ouvir e não pode recusar, nem recusará”.
Deste
modo, Davi se apropria, pela fé, de uma das mais gloriosas expressões do
Antigo Testamento: “Compadece-te de mim, ó Deus”; e seu argumento é
este: “Segundo a tua benignidade”. Davi arrisca o seu tudo nesta
expressão, a grande expressão da aliança do Antigo Testamento. Ela
significa o imutável amor de Deus, sua fidelidade às suas promessas.
Esta expressão nos diz que Deus é leal ao seu povo. Deus prometeu que
perdoaria, então, Ele perdoará. Deus prometeu que purificaria, então,
Ele purificará. Deus prometeu que salvará, então, Ele salvará.
Mas
Davi não parou nisso, porque o imutável amor de Deus está vinculado à
“multidão das suas misericórdias”. Na realidade, Davi estava dizendo:
“Senhor, sinto-me encorajado a rogar por compaixão, porque Tu mesmo me
tens dito que és rico em misericórdia. A tua compaixão não se escoa em
pequenas gotas; ela é um oceano. Rios, torrentes e fontes inesgotáveis
de compaixão fluem de Ti. Quando contemplo minha vileza e corrupção,
compreendo que mereço o inferno e a condenação. Apesar disso, eu Te
suplico compaixão, por causa do que Tu és e do que tens prometido.
Embora eu seja pecador, ouso suplicar por compaixão”.
Você está
convencido de seu pecado diante de Deus? Certamente, você tem de estar.
Você tem de fazer como Davi. Assim como Davi o fez, levante os seus
olhos para Deus, confesse seus pecados, apresente-Lhe uma razão para que
Ele o perdoe. Deve ser a mesma razão, mas com uma diferença: essa razão
agora tem um nome e uma personalidade, pois a benignidade de Deus veio à
terra e a amável compaixão de Deus nasceu neste mundo. A fidelidade de
Deus para com a aliança tornou-se carne, incorporou-se em Jesus de
Nazaré. Ele é a benignidade e a amável compaixão de Deus. Ele viveu uma
vida de obediência humana perfeita, que recebeu a aprovação de Deus.
Jesus sofreu e morreu na cruz do Calvário, a fim de pagar o preço dos
pecados de todo o seu povo. Jesus ressuscitou dos mortos, no terceiro
dia, para mostrar que o Pai aceitou o que Ele havia feito. Assim, em
nosso dias, quando alguém suplica: “Compadece-Te de mim, ó Deus”, pode
amparar a sua súplica, dizendo: “Compadece-Te de mim, por amor a Jesus”.
Você
entende a maravilha do que estamos dizendo? Um dos mais desprezíveis
criticismos lançados contra o evangelho é proferido por aqueles que
criam um conflito entre um Deus de amor e um Deus de ira e julgamento.
Você já ouviu tais indivíduos: “Pecado, inferno, condenação! Eu não
acredito em um Deus como esse. Eu creio em um Deus de amor”. Mas eles
estão completamente errados. O deus deles é um ser moralmente deficiente
e apático. É um deus que vê o mal e não se importa. É um deus que
contempla aqueles que abusam de criancinhas e se recusa a considerar
este ato com seriedade. É um deus que ouve o soluço de um mundo abatido,
atormentado e sorri com tola indiferença. É um deus que vê a impiedade
envenenando a terra e não se importa em levantar um dedo para socorrer.
Esse é o deus de amor deles. Mas isto não é amor; é uma imbecilidade
ética.
O que é amor? Amor é o Deus perfeita e infinitamente
santo, que, com todo o seu ser, odeia o pecado. Aos seus olhos, não
existe nada mais repugnante do que o pecado. Deus tem olhos tão puros,
que não podem ver o pecado. Deus o detesta; é uma abominação para Ele.
Deus está comprometido em castigar o pecado. Ele olha para os pecadores
em toda a sua repugnância, rebelião, inimizade e ódio. E o que faz este
Deus santo, justo? Ele ama estes pecadores e escolhe, dentre eles, uma
grande multidão para serem dEle mesmo. Deus toma o seu único Filho, o
deleite de seu coração, que tem estado com Ele por toda a eternidade, e O
envia à humilhação de uma vida na terra e ao horror de uma morte cruel.
Da
cruz, nas trevas, o Filho de Deus clama ao seu Pai: “Por que me
desamparaste?” Muitos de nós temos filhos. Suponha que um deles acorde,
em uma noite escura, temeroso e clamando: “Papai, onde você está?”; e
você caminhe na ponta dos pés até ao quarto dele. Enquanto seu filho
está deitado na cama, clamando, você toma uma vara e, silenciosamente, o
surra, por diversas vezes, no escuro; depois, sai e o deixa ali. Isso
foi o que Deus fez. Ele não poupou seu próprio Filho.
Não fale
sobre um Deus de amor que não trata o pecado com seriedade. Pois “Deus
prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido
por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm 5.8). O amor não consiste em
ignorar o pecado ou deixá-lo de lado. O amor se manifesta em Deus enviar
seu Filho para ser o pagamento de nosso pecado. “Deus amou ao mundo de
tal maneira que deu o seu Filho unigênito” (Jo 3.16). Você pode entender
o amor de Deus somente quando entende o pecado. Aquele que foi pouco
perdoado ama pouco; aquele que foi muito perdoado ama muito.
Por
que estou enfatizando o pecado? Para que você ame a Jesus com todo o seu
coração e toda a sua alma. Para que você adore, louve, seja grato a
Jesus, por toda a eternidade, para sempre e sempre! Você, pecador,
rebelde, não-convertido, hipócrita, compreende que necessita de
compaixão? Com certeza, necessita. Você quer compaixão? Eu lhe ofereço
compaixão — em Jesus. Você tem de encarar seus pecados; tem de
clamar. Ninguém pode fazer isso por você. Um pastor não pode fazê-lo por
você, nem um sacerdote, nem um rabino. A compaixão não vem por
sacramentos e rituais. Tampouco vem por meio de comparecer às reuniões
de uma igreja.
Você tem de dizer para si mesmo: “Minhas transgressões, minha iniquidade, meu pecado”. Você tem de declarar: “Sou um homem imundo, enfermo, culpado, devedor e desamparado.
Não tenho desculpas a apresentar. Não existe nada que eu possa fazer”.
Então, entregue-se completamente ao Senhor Jesus Cristo. Invoque-O.
Receba-O, descanse nEle para a sua salvação. Contemple-O pendurado na
cruz em seu lugar, de modo que, pela fé, você possa dizer: “Ele foi
traspassado por minhas transgressões. Eu tenho iniquidade, mas Ele foi
moído em favor das minhas inquidades” (cf. Is 53.5). Meu querido amigo,
coloque toda a sua fé e toda a sua esperança em Jesus Cristo. Descanse e
confie nEle.
Deus é maravilhoso! Ele dará a você, se crer em Jesus, a justiça dEle. Não é uma justiça humana, nem de um santo eminente, nem da melhor pessoa que já viveu neste mundo; é a justiça criada no céu — infinita, eterna e imutável. É a própria justiça de Deus! Isso é o que o apóstolo disse: “Não me envergonho do evangelho... visto que a justiça de Deus se revela no evangelho” (Rm 1.16,17). A justiça de Deus — Ele a lançará em seu crédito, para que, ao olhos dEle, você seja justo como Ele é! Deus haverá de considerá-lo tão justo quanto o próprio Senhor Jesus. Nenhuma imperfeição, nenhuma mácula, nem mesmo qualquer traço de pecado, mas perfeito. Quando Deus olha para alguém que está em Cristo, o que Ele diz? “Meu querido, meu amado, meu deleite de coração, meu filho, minha filha, em quem Eu me comprazo.” Jesus se oferece a você agora como Salvador. Jesus lhe ordena que venha a Ele.
Mas será que você está se posicionando contra Deus? Está dizendo para
si mesmo: “Eu não vou. Eu não vou”? Deus tenha misericórdia de você.
Esta noite, sem dúvida, você se deitará em sua cama, apagará a luz e
ficará no escuro. Porém, eu lhe digo, quando a sua cabeça estiver sobre o
travesseiro, lembre-se de que a escuridão em que você está descansando é
tranqüila e feliz, se comparada com as trevas do inferno nas quais você
estará para sempre, onde o tormento reina e onde existem o choro, a
lamentação e o ranger de dentes.
Não rejeite Jesus Cristo! Quão bom é Deus para nós! Por que Ele viria a você e lhe ofereceria seu próprio Filho? Quão amável Ele tem sido para você! Quão gracioso! Existem milhões de pessoas no mundo que nunca ouviram ou leram a respeito de Jesus; no entanto, Deus está oferecendo seu Filho a você! Você continua dizendo: “Eu não vou!” Se continua, diga para si mesmo neste momento: “O que está errado comigo? Com que laço o diabo envolveu minha mente e meu coração, de modo que, ouvindo e lendo sobre a pessoa de Jesus, não quero ir a Ele? Senhor, quebra este laço! Muda-me! Salva-me!”
Talvez, pela misericórdia de Deus, você queira vir a
Cristo. Deus tem falado com você. A Palavra dEle tem falado ao seu
coração. Em seu íntimo, você sabe que o evangelho é verdadeiro e que
existe apenas um Salvador. Você sabe que precisa desse Salvador.
Sente-se convicto e arrependido, contemplando em Jesus a misericórdia de
Deus. Então, eu lhe digo: “Venha a Jesus; venha agora mesmo. Venha a
Ele com seu próprio coração. Invoque-O, suplicando que o salve. Clame
por Jesus, meu amigo, e Ele o receberá”. Não existe qualquer
possibilidade de que o Senhor Jesus o lançará fora. Ele mesmo afirmou:
“O que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora” (Jo 6.37). Não importa
o que você fez no passado. Não importa quão ímpio ou quão culpado você
é, nem quantas promessas você deixou de cumprir, nem quão freqüentemente
você tentou fazer o melhor de si mesmo, mas falhou. Você pode estar
pensando: “Não posso ir a Cristo; Ele me verá como um mentiroso”. Não,
não! Se você está sendo sincero, verdadeiramente sincero, venha a Cristo
e torne sua a oração de Davi, reconhecendo que a salvação de Deus é
para você. Faça aquela oração tendo apenas um nome em seu coração — a
única esperança de um pecador, o único nome que Deus, o Pai, sempre
ouvirá e nunca recusará: “Compadece-te de mim, ó Deus. Apaga as minhas
transgressões. Lava-me completamente da minha iniqüidade e purifica-me
do meu pecado, por amor a Jesus. Amém”.
Edward Done lly é ministro da Trinity Reformed Presbyterian Church, em Newtownabbey, na Irlanda; professor de Novo Testamento no Reformed Theological College (Belfast), preletor em conferências teológicas internacionais, autor de diversos artigos e livros, um deles publicado em português pela Editora PES: “Depois da morte: o que?”.
http://www.editorafiel.com.br/artigos_detalhes.php?id=177
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