O
livro de Atos, em seu capítulo 4, versos 23 a 31, apresenta uma das
orações mais poderosas feitas pela Igreja, no Novo Testamento. Os
eventos anteriores a estes momentos da Igreja na presença de Deus foram a
cura de um homem coxo, que ficava assentado “à porta do Templo, chamada Formosa, para pedir esmola aos que entravam”
(3.2); a interrogação de João e Pedro no Sinédrio e, finalmente, a
libertação dos dois (4.1-22). As autoridades religiosas não acharam como
os castigar, “por causa do povo, porque todos glorificavam a Deus pelo que acontecera” (4.21).
Uma vez soltos, Pedro e João procuraram
os irmãos da Igreja e lhes contaram suas experiências. Como reagiu a
Igreja de Jerusalém diante das ameaças do Conselho do Sinédrio? Eles não
nomearam, como muitas vezes fazemos, uma comissão de pastores e experts,
para analisar a situação em duas semanas e prestar um relatório
apontando a melhor posição a ser tomada diante daquela situação de
perseguição religiosa. Ao contrário, pois, após ouvir o relatório dos
apóstolos, diz a narrativa bíblica que a Igreja pôs-se a orar com
unanimidade: “Ouvindo isto, unânimes levantaram a voz a Deus” (v. 24). A reação imediata foi a de dirigir a Deus uma oração. Esse foi o primeiro recurso de que lançaram mão.
Observe que não foi uma simples oração,
sem fervor, como que para cumprir um rito da Igreja, mas uma oração
coletiva, efervescente, feita com o mesmo propósito. Lucas diz que a
Igreja pôs-se a orar com unanimidade: “unânimes levantaram a voz” (v. 24).
A palavra “unânime”, tantas vezes utilizada por Lucas para descrever as ações da Igreja primitiva, vem do grego homothumadon.
Esta é uma daquelas palavras que não se encontra uma tradução adequada
na nossa língua. Nesta passagem, bem como em outras onde essa palavra é
usada (10 vezes em Atos e 1 vez em Romanos), seu sentido fica
enfraquecido. Morfologicamente, é um composto de duas palavras gregas: homo (junto, o mesmo) e thymos
(paixão, raiva, fúria, ira que ferve de forma imediata e logo se acalma
outra vez). Os termos, em conjunto, significam, entre outras coisas:
“com uma só mente”, “de comum acordo”, “com uma paixão”, “com a mesma
emoção”, “com o mesmo sentimento”.[1] A imagem é quase
musical; um conjunto de notas é tocado e, mesmo que diferentes, elas se
harmonizam em grau e tom. Como os instrumentos de uma grande orquestra
sob a direção de um maestro, assim o Santo Espírito harmoniza as orações
feitas pelos crentes da Igreja de Cristo.
O Dr. Russel Shedd destaca aqui a
importância do princípio da união. Afirma que, nesse caso, eles, os
apóstolos, não desprezaram a palavra de Jesus, de que se pelo menos duas
pessoas “concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, esta ser-lhes-á concedida” (Mt 18.19). Desconhecemos, com frequência, a força que a sintonia e união espirituais acrescentam à oração.[2]
Também, Lucas registra que eles não oraram em silêncio, mas transmitiram com suas vozes o que queriam: “[todos] levantaram a voz a Deus”.
O Dr. Shedd aponta que “dessa maneira todos podiam reforçar os pedidos,
assim como muitos fios torcidos formam um cordão que dificilmente pode
ser rompido”.[3]
A oração precisa ser prioridade na vida e
na agenda da Igreja. A Igreja que desconhece o poder da oração é um
gigante adormecido. A glória da Igreja é medida não pela beleza de seu
edifício ou pela pujança de seu orçamento, mas pelo poder espiritual
oriundo da oração.
O Rev. Charles Haddon Spurgeon, no século XIX, já lamentava em suas pregações:
Infelizmente, são muito comuns as igrejas sem reuniões de oração. Mesmo que haja apenas uma assim, devemos chorar por ela. Em muitas igrejas a reunião de oração é apenas o esqueleto da reunião: a forma é preservada, mas as pessoas não vêm. Não há nenhum interesse, nenhum poder ligado à reunião. [...]. Se você mesmo ora, há de querer que orem consigo, e quando começam a orar com você, e por você, e pelo trabalho do Senhor, eles mesmos desejarão mais oração, e o apetite crescerá. Creia-me, se uma igreja não ora, ela está morta. Em vez de pôr a reunião de oração em último lugar, ponha-a em primeiro. Tudo depende do poder de oração na igreja.[4]
Infelizmente, muitas Igrejas têm
abandonado a vida de oração. O Rev. Hernandes Dias Lopes afirma que
“hoje nós gastamos mais tempo com reuniões de planejamento do que de
oração. Dependemos mais dos homens do que de Deus. Confiamos mais no
preparo humano, que na capacitação divina”.[5]
Consequentemente, temos visto muitas igrejas serem derrotadas por
Satanás, quase fechando as suas portas, sendo que outras já viraram
museus ou escolas. Quem sabe este não é um dos motivos de que somos
vistos como uma geração de cristãos sem um compromisso verdadeiro com a
Palavra de Deus; vistos como uma geração que serve de longe?
Muitos cristãos creem na eficácia da
oração, falam da necessidade da oração para o crente e para a Igreja,
mas poucos oram. Eles leem muitos livros sobre o poder da oração, mas
não oram. A grande verdade é que temos bons postulados teológicos sobre
oração, mas não temos fome por Deus. Temos muito conhecimento de Deus,
mas não o amor por Ele, nossas mentes tem luz, contudo nossos corações
não têm fogo de vida. Temos erudição, mas não temos o poder espiritual.
Hoje buscamos nos preparar para concursos, vestibulares, provas e
outros desafios que a vida nos proporciona, mas nossos corações estão
vazios, ocos e sem Deus.
Estamos nos comportando como a Igreja de
Laodiceia: uma igreja sem fervor espiritual, morna, rica
financeiramente, mas pobre espiritualmente. Considerava-se rica e
abastada, mas aos olhos de Cristo era uma Igreja pobre, cega, nua e
miserável (Ap 3.14-22). O problema da Igreja de Laodiceia não era
teológico nem moral. Não havia falsos mestres, nem heresias. Não havia
pecado de imoralidade nem engano. Não há na carta menção de hereges,
malfeitores ou perseguidores. O que faltava à Igreja era fervor
espiritual. A vida espiritual da Igreja era morna, indefinível,
apática, indiferente e nauseante. A Igreja era acomodada. O problema
da Igreja não era heresia, mas apatia.[6]
Conta-se que São Tomás de Aquino certa
vez fez uma visita ao Papa Inocêncio IV, em Roma. Este, depois de lhe
haver mostrado toda a fabulosa riqueza do Vaticano, disse, com tom de
sarcasmo, fazendo alusão às palavras de Pedro ao coxo do templo, que
ficava na porta Formosa (At 3.6):
- Vês, Tomás? A Igreja não pode mais dizer como Pedro, nos primeiros dias: “Não tenho prata nem ouro…”.- É verdade – confirmou Tomás. Mas também não pode mais dizer ao coxo: “Em nome de Jesus Cristo: Levanta-te e anda”.
O Rev. Hernandes Dias Lopes faz o
seguinte alerta: “Em muitas igrejas as reuniões de oração estão
agonizando. As pessoas estão muito ocupadas para orar. Elas têm tempo
para viajar, trabalhar, ler, descansar, ver televisão, falar sobre
política, esportes e teologia, mas não gastam tempo orando”.[7]
O Rev. Charles Haddon Spurgeon ensinava a
seus alunos que, dentre todas as influências formativas que poderiam
fazer um homem honrado de Deus, no ministério, ele não sabia de nada
mais poderoso do que a própria familiaridade com o propiciatório. E
conclui sua lição, ensinando que: “A oração é a ferramenta do oleiro com
a qual ele molda o vaso. Todas as nossas bibliotecas e estudos são um
mero vazio comparados com nossas salas de oração. Crescemos, lutamos e
prevalecemos na oração em secreto”.[8]
Aprendamos uma coisa: “É no lugar
secreto de oração que a batalha espiritual é perdida ou ganha”. A oração
não é um ópio, que entorpece a alma, mas um tônico que renova as nossas
forças; não é um calmante para o sono, mas o despertamento para uma
nova ação. Um crente espiritualmente preguiçoso não consegue orar,
porque a oração demanda energia e força de vontade.
O apóstolo Paulo considerava a oração como uma poderosa arma na batalha espiritual: “Recomendo-lhes,
irmãos, por nosso Senhor Jesus Cristo e pelo amor do Espírito, que se
unam a mim em minha luta, orando a Deus em meu favor” (Rm 15.30, NVI).
Paulo foi um homem de muita oração.
Nenhum crente pode ser forte se não ora. Os grandes líderes da Igreja
foram homens de oração: Abraão, Moisés, Josué, Neemias, Paulo, Lutero,
Calvino, John Knox, George Whitefield, Jonathan Edwards, John Wesley,
Charles Finney, D.L. Moody, entre outros grandes homens de Deus.
Sem oração, todos os nossos projetos,
por melhor que sejam, fracassarão. Por isto, não devemos apenas orar,
mas viver em oração. Jesus ordenou que orássemos sem cessar. Todo líder
cristão que quiser exercer o seu ministério pastoral com eficiência deve
dedicar sua vida à oração.
Você está cansado das orações sem poder
que saem de seus lábios? Está desejoso de que sua Igreja inicie um
poderoso ministério de oração para que seu bairro, cidade e Estado
conheçam o poder de Deus que há em sua Igreja? Se este é o seu desejo, e
se você se dispuser a pagar o preço, então se prepare para ver Deus
operar poderosamente, e modificar sua vida e ministério, introduzindo-o
numa nova dimensão de oração.
Como é essencial que conheçamos e
compreendamos a importância da oração! Mas, se não aprendermos a orar,
não haverá meios de vermos a vontade de Deus realizada em nossa vida e
ministério. Contudo, primeiro precisamos ter o desejo de orar.
Nosso problema é que pensamos muito
sobre a oração, lemos muito coisa a respeito dela, e até recebemos
algumas instruções acerca da oração, mas não oramos. Chegou a hora de
compreendermos que a oração é a fonte do poder de Deus à nossa
disposição. Chegou a hora de permitirmos que o Espírito Santo opere em
nós um novo quebrantamento e submissão a Deus. Chegou a hora de
aprendermos a exercitar nossa autoridade espiritual. Chegou a hora de
orarmos.
* Este texto é parte integrante do livro em preparo do autor: GOMES, Daniel Miranda. Tendo eles orado… : a importância da oração na vida e no ministério da igreja. Curitiba: s/e, 2010.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
-
STRONG, James. Dicionário Bíblico Strong: léxico hebraico, aramaico e grego de Strong. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2002, p. 2.636.
-
SHEDD, Russel. Adoração bíblica. São Paulo: Vida Nova, 1991, p. 106.
-
Idem.
-
SPURGEON, Charles Hadon. Preparado para o combate da fé: as armas do ministério – a igreja, a palavra, o Espírito Santo. São Paulo: Vida Nova, 2005, p. 26.
-
LOPES, Hernandes Dias. Piedade e paixão: a vida do ministro é a vida do seu ministério. São Paulo: Candeia, 2002, p. 42.
-
LOPES, Hernandes Dias. Estudos no livro de apocalipse. São Paulo: Hagnos, 2007, p. 54.
-
LOPES, Hernandes Dias. Piedade e paixão, p. 46.
-
SPURGEON, Charles Haddon. Lectures to my students: complete & unabridged. Michigan: Zondervan, 1954, p. 43.
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